Lacieverso #24 || Hortênsias FINAL

Boas vindas, convidado. Este chá da tarde é o último do ano, e o último por alguns meses.

Finalmente chegamos ao final de Hortênsias — e que viagem até aqui! Fico feliz em saber que consegui entregar uma obra completa e muito boa para vocês. Gostaria de receber seus feedbacks no final.

Esta news entrará em hiatus por algum tempo, até o lançamento da próxima obra do Lacieverso: Sincronicidade, que deve ser por volta de Maio de 2024. Mas antes disso teremos algo muito especial em Abril, então aguardem novidades!!! 2024 vai ser um ano incrível ♥

Agora vamos ao capítulo final de Hortênsias!

Hortênsias

CAPÍTULO DOZE

ARREPENDIMENTO

Você estava ali.

vivo, vivo, vivo

Mas na penumbra da noite, eu conseguia distinguir os sinais. Através das minhas lágrimas, eu sabia que havia chegado ao final das lembranças. Que Dezembro havia chegado, e com ele, meu relacionamento com Jesse. Você estava ali, e não estava.

Pela primeira vez naquela noite, eu me aproximei de você, e tentei tocar-lhe as bochechas borradas de lágrimas. Queria consolá-lo, pedir desculpas. Mas você era intangível. Você não estava ali. Era minha culpa feita sólida. Eu deixei você cair.

E você abriu a boca.

E o que me cortava saia de mim, sua voz se confundindo com a minha, e quando notei, ela era uma só. Uma só batida, um só corpo, uma violência só. Eu era você. Não havia mais ninguém ali naquele quarto escuro naquela manhã de Maio.

O alarme soou.

O dia amanheceu.

E a vida seguiu.

Dizem que só existem sete forças no mundo físico. A maior delas é que une os núcleos dos átomos, e que mantém própria integridade do universo. Eu digo que existe outra forma maior: a do hábito. Apenas ela me fez levantar mais um dia, com todas as memórias da noite anterior, e conseguir ser um ser humano minimamente funcional. Eu me levantei. Comi. Vomitei. Escovei os dentes. Bebi uma água e um remédio para o estômago. Tomei um banho. Encarei meus materiais de arte, pensando ainda se valia a pena. E esperei.

Não sabia o porquê, até olhar o calendário e ver marcado a data circulada em vermelho. Era a data final, o dia em que eu deveria estar me formando, mas na verdade, era quando eu estaria me encontrando com o Jesse. Ainda tinha algumas horas antes do encontro, mesmo assim, me arrumei e saí, andando por aí. Quando finalmente deu o horário, fui em direção à ponte.

Ele estava ali.

Ainda mirrado, ainda um pouco surrado, mas parecendo um pouco mais alimentado que antes. As bochechas mais coradas. Usava um sobretudo cinza, que combinava bem com os cabelos dourados. Os olhos continuavam fundos, e eu sabia que se ele tirasse aquelas camadas de roupa, ainda encontraria a mesma tatuagem de hortênsias, mas agora, também encontraria as bandagens que ele usava para esconder as cicatrizes em seu pulso. Doía um pouco ver aquilo.

— Ei — ele disse.

— Ei — eu correspondi.

Ficamos em silêncio, sem saber o que dizer um para o outro.

— Cinco meses, né?

— Não vai perguntar se estou bem?

— Acho que você acharia isso meio chato.

Ele sorriu.

— É meio estafante. Eu não sei o que responder a maior parte das vezes, porque as pessoas não esperam a verdade, ou uma resposta pronta, que é mentir. Então eu fico sem saber o que responder, na verdade. Obrigado por não perguntar. Como você passou esses meses?

— Meio parado. Larguei a faculdade.

— Que merda. Você não estava indo bem no curso mesmo.

— Pois é.

— Eu gosto dos seus desenhos, no entanto.

— Obrigado. E você?

— Por aí. Fazendo terapia, mais.

— Que bom.

— É. Eu queria te pedir desculpas, Alex.

— Desculpas?

— Porque...

 

Quando eu acordei no hospital, eu vi apenas branco. Eu fiquei muito aliviado. Porque eu tinha conseguido finalmente o que eu queria, que era morrer.

Mas aí tudo entrou em foco, e eu vi o rosto de Nama e Chase, e eu soube que eu tinha errado o caminho em algum lugar. Algum cálculo errado na hora do lançamento. E eu quis morrer de novo, porque agora eu tinha preocupado as duas pessoas mais importantes da minha vida.

Mas eu estava cansado de viver.

Minha mãe tinha a voz de quem havia vivido mil vidas em uma.

— Por quê, Jesse? — ela chorou ao meu lado. Meu irmão também estava em lágrimas, mas ele tinha uma vermelhidão raivosa por debaixo, e falou:

— Alex e Dave acharam você a tempo e...

Ah, meus algozes favoritos.

Eu só quero fechar os olhos.

— Alex quer te ver, Jesse.

Eu o ignorei mais uma vez.

— Jesse?

— Me deixem em paz. Eu não quero ver ninguém.

— Jesse, por favor, fale com a gente. Chase me contou...

— Me deixem em paz, por favor.

— Que você foi na casa do seu pai...

você está doente

você sempre quer, não é

— O que aconteceu lá?

— Me deixem em paz! — eu gritei, e uma das enfermeiras apareceu, falando em seguida em murmúrios baixos com minha mãe.

— Tudo bem, Jesse. Já volto.

E os dois me deixaram com a minha solidão e a minha culpa.

 

Mas eu não poderia fugir para sempre.

Chase voltou uma hora depois, com comida.

— Para você. A enfermeira mandou.

Eu deixei de lado, ainda sem fome.

— Vai ficar sem comer?

Eu não disse nada.

— Porra Jesse, fala algo.

— Eu estraguei o Natal de todo mundo, não foi?

— Bem, foi. Mas o Natal já estava estragado para você há muito tempo, né?

Fiquei em silêncio, e comecei a remexer a comida só para não ter que encarar o olhar incisivo de meu irmão. Ele estava do meu lado, e então se sentou em uma poltrona, afundando-se. Estava cansado, e eu também.

— Porra, Jesse, eu tive tanto medo de te perder. Eu não queria...

— Eu sei.

— Por que, então?

Fiquei em silêncio, remexendo as respostas. Eu poderia dar várias, inclusive mentir para sair daquela situação. Mas seria somente para voltar para a casa um, para o início da ladeira, e começar a rolar os problemas montanha acima novamente. Talvez fosse a hora de tentar uma nova abordagem.

Pedir ajuda.

— Eu... me sinto muito sozinho.

Chase ficou em silêncio.

— Eu sempre me senti muito solitário. E às vezes, quando eu me sentia assim, eu procurava a companhia de outra pessoa.

Chase prendeu a respiração.

— Uma delas foi o Mitchell. Ele me prometeu que ficaríamos juntos, e que iriamos namorar.

O silêncio perdurou por mais algum tempo.

— Eu sabia disso — Chase disse, por fim.

— Você sabia?

— Ele me contou esses dias, desde o... que aconteceu. Mas eu desconfiava na época.

Eu me encolhi na cama. Meu segredo máximo com meu irmão era aquele.

Chase também tinha um para me contar, aparentemente.

— Eu quem decidi roubá-lo, mesmo ao custo da sua felicidade.

— Chase...

— Eu achava injusto você ganhar todas as coisas boas. Você era bom em tudo, e eu não. Você sempre foi mais atlético, mais bonito, mais inteligente. Eu queria uma coisa apenas minhas. E quando chegamos para dividir Mitchell... eu o queria apenas para mim. E eu o consegui. Era minha vitória final sobre você. — Chase desabafou, sentindo as lágrimas escorrerem. — Céus, a culpa foi minha?

— Não, Chase.

Mas eu não conseguia dizer mais nada.

Eu estava cansado.

— Eu só quero morrer.

O que fez Chase chorar ainda mais.

— Jesse, por favor, vamos procurar ajuda na terapia... Você precisa, eu acho que preciso também... Vamos, por favor.

Eu fiquei calado, mas assenti.

Esses meses todos eu estive em um instituto psiquiátrico, e isso me ajudou a princípio. Agora que estou livre, estou vendo um psiquiatra com frequência.

— Não que todo dia seja fácil — sorri.

— Dave falou com você.

— Sim. Algo do tipo.

 

Quando eu voltei para casa, nos primeiros dias do ano novo, ele estava ali, nos jardins, esperando. Não sei como soubera que eu estava de alta do hospital, mas ele certamente tinha seus meios. Mas Dave estava sozinho, e ele estava tremendo, o que eu achei de imensa coragem da parte dele. Ele estava com seu caderninho em mãos, e pediu para conversar comigo.

— Vou ficar de olho.

— Mãe...

— Fique meia hora só, Jesse.

Agora eu tinha horário, que bom. Ao mesmo tempo, era bom ver que ela se importava.

— Eu tenho um discurso preparado, então me aguente — ele falou, enquanto Chase e Nama entravam na casa. Minha mãe ficou na janela da sala de estar, olhando para nós nos jardins. Dave começou. — Jesse, seu filho da puta desgraçado...

— Ei, como você fala assim de um enfermo?

— “Como você tem coragem de nos abandonar? Como você tem coragem de fazer isso na casa de Alex? Como você tem coragem de... repetir meus erros?” Ah, foda-se, vou improvisar.

Ele pigarreou, os olhos mel turvos. — Você sabe que as coisas não podem continuar deste jeito. Você não pode voltar para nossas vidas e as coisas simplesmente continuar as mesmas.

— Eu sei que fiz merda, Dave, mas quero reatar as coisas com Alex.

— Não do jeito que vocês deixaram as coisas. Alex ficou uma merda depois que você foi embora. Não importa os motivos, você tomou uma decisão egoísta e mudou tudo. Ainda mais sem querer vê-lo no hospital.

— Eu sei.

— Você tem noção do quanto ele se culpa? Foi o estilete dele.

— Me parece que apenas tomei a mesma decisão que você.

Dave era fúria encarnada, mas Samuel segurou em seu ombro.

— Então é isso? Vai ficar agourando a vida de Alex, um fantasma em forma viva?

— Não é isso que você faz? Fica de mãos dadas com ele, impedindo-o de seguir em frente?

Nós dois ficamos parados, as palavras apenas cortando nossas peles, a cicatriz em ambos nossos pulsos irmãs gêmeas, tendo nascido no mesmo local onde hortênsias floresciam.

— Vai ficar parado para sempre?

— E você, vai fazer o mesmo?

Nós dois ficamos em silêncio, a compreensão e o amor mútuo à mesma pessoa presente. Estávamos ressentidos um com o outro porque abusamos da mesma pessoa várias e várias vezes. E ela nos perdoaria, todas as vezes.

Mas era a hora de parar.

 

— E agora?

— Por hora, vou continuar meu tratamento. Eu tenho coisas que eu preciso resolver por mim mesmo, que eu não conseguia por estar tão preso dentro de mim. E eu te machuquei. Não sei como você espera que exista algo entre nós depois do que eu fiz.

Meus sentimentos transbordaram.

— Eu amo você.

Mas não alcançaram os dele.

— Eu não consigo responder a isso, nesse momento. Por agora, eu não consigo amar ninguém, nem a mim mesmo. Eu...

— Não quero lhe forçar a nada.

— Eu sei, Alex. Eu sei que você é a criatura mais gentil que existe na Terra. Mas você também tem sua cota de problemas. Eu sei que você se apaga para que as outras estrelas possam brilhar. Eu não quero isso. Eu quero que você consiga ser feliz também.

—Você não pode tomar essa decisão por mim.

— Se eu puder te fazer um pouco mais feliz, estando longe de você, eu irei.

— Eu não quero ficar longe de você.

— E nem eu de você..., mas precisamos de um tempo. Foi tudo muito rápido. Muito intenso. Nos consumimos de uma forma que nos queimamos por inteiro.

— Jesse...

— Se for pra ser, assim será.

— Eu vou te esperar.

— Não quero que me espere. Quero que viva. E se algum dia for para eu voltar para você, nós faremos dar certo.

Nos olhamos, como dois planetas se atraindo, mas finalmente, saí de sua órbita. E com um abraço final, terno e quente, nos despedimos pela última vez naquela manhã de Maio.

 

Não sei como encontrei forças para retornar para casa. Meus passos me levaram perigosamente para perto do parapeito da ponte, e eu encarei-a por algum tempo, tentando ver algo

a luz

o nada

uma estrela cadente

Até encontrar forças para retornar para o meu apartamento e para minha vida normal, para capturar os fragmentos e tentar fazer um vaso com eles e talvez florescesse alguma semente dali.

Mas meus algozes não esperavam, e na frente do meu apartamento estava Dave e Samuel, de mãos dadas. Que bom que aquele relacionamento foi para frente, ao menos. Às vezes eu duvidava de Dave, mas era bom ver o quanto ele conseguia ser forte.

— Sam, eu preciso falar com Alex.

E ele assentiu, deixando que nós dois entrássemos no pequeno cômodo.

De repente, o kitnet parecia pequeno demais. Dave parecia ter crescido e se tornado um adulto, e eu a criança cansada demais. Estava tudo uma bagunça, cheia de caixas de delivery, e eu apenas esperei de pé enquanto Dave seguia para o fundo do apartamento.

Não sabia o que ele queria.

— Sabe, Alex... nós adiamos essa conversa por tanto tempo, que nem sei como começar.

Fiquei em silêncio e apenas cruzei os braços.

 — Você sabe muito bem como cuidar das pessoas, mas não faz a mínima ideia de como cuidar de si mesmo. Você sempre fugiu dessa responsabilidade em específico. Está na hora de reaver relações, e de fingir que está tudo bem entre nós.

— Mas está...

está tudo bem?

(não está, ecoou)

— Eu sei que meu histórico de mentiras não é muito bom, e por isso você e minha mãe desconfiam muito de mim, mas pela primeira vez, quero ter uma conversa honesta com você. Sem mentiras, engodos ou enganações. Apenas a verdade.

E ele sentou-se na cama, me convidando a fazer o mesmo.

— Nós fomos ligados pelo acidente, mas...

não solte a minha mão

não vou soltar

— Tem outra coisa que aconteceu que eu preciso te contar.

— Fale.

— O tutor...

— Porter — cuspi o nome dele. — Ele era um desgraçado.

— Você sabe que ele me abusou de verdade. Eu tinha treze anos.

Fiquei em silêncio. Na época, não estava claro como aconteceram as coisas. Dave dissera que eles tiveram um caso, mas agora, pensando bem, que homem de vinte anos deveria ter um caso com uma criança? Era muito estranho. Um ódio me subiu a garganta e lágrimas desceram dos meus olhos.

Porque a culpa era minha.

— Ele me contatou naquele dia em que eu fugi. Eu ainda não sabia lidar com isso, e minha ansiedade precisava ser extravasada. Desculpe-me se te preocupei.

—  Dave, me desculpa, eu... eu fui cego.

— Não precisa pedir desculpas, Alex, não foi você quem me abusou.

— Mas fui eu quem te apresentei o cara, que fiz você confiar nele.

— Mas você não tinha como saber. E mais do que tudo, todos os dias, você me proveu uma coisa para que eu pudesse me recuperar. Você me proveu seu tempo e amor, o que eu agradeço por demais.

E ele segurou em minhas mãos trêmulas e frias, e dela, nasceu uma semente.

— Agora é você quem precisa de tempo e amor, meu amigo. Tempo, amor e recursos. Acho que consigo providenciar algumas coisas para você, mas outras, apenas você precisa pedir.

E nas minhas mãos, apareceu um celular novo, com um número desconhecido no visor.

— Dave?

— Disque aí.

Completei a ligação, e coloquei o telefone contra meu ouvido. Os segundos em que o celular apitava fizeram nascer várias vinhas, e quando finalmente ouvi a voz daquela pessoa, daquele homem que um dia foi tudo para mim e que agora era um completo estranho, eu senti a minha voz falhar.

— Pai?

— Alex?

Minha voz não saía, e eu não sabia o que dizer. Olhei para Dave, que me encorajava com uma mão em minha perna. A voz de meu pai era profunda e encantadora.

— Você está bem?

E no fundo, importava.

Minhas lágrimas inundaram a plantação e as hortênsias finalmente deram sua última flor:

— Não, não estou.

CAPÍTULO TREZE

O LUGAR AO QUAL EU PERTENÇO

5 ANOS DEPOIS

 

Aquela ponte era um ponto nostálgico já. Era meio mórbido, porque aparentemente no último final de semana mais um ciclista tinha perdido a vida ali, então estavam pensando em fechá-la por um tempo para a passagem de carros e permitir apenas a passagem de pedestres, então talvez ela se tornasse um ponto turístico. De qualquer forma, deixei um pequeno ramo de hortênsias brancas no pequeno memorial, como fazia com todos os outros, em um pequeno ritual.

Mas em minhas mãos estava o outro componente daquele encontro, e logo encontrei meu “encontro quente” da vez. O certo, para variar.

Ele tinha mudado muito, e nada, naqueles cinco anos. O rosto estava mais fino, os músculos mais inchados, mesma altura baixinha. Cabelos dourados mais curtos, olhar mais afiado. Roupas mais decentes, o mesmo sobretudo cinza. Ele aceitou o picolé, mesmo sendo o meio de Novembro e o inverno começar a chamar nossos nomes nos uivos das montanhas, mas ele apenas sorriu ante a brincadeira.

— É bem a sua cara, mesmo, Alex.

— Prometo que atende todas as restrições pós-pandemia.

Jesse ficou em silêncio, um sorriso no rosto. Cinco anos nos separavam. Nós havíamos mudado.

— Mitchell e Chase vão se mudar para um apartamento próprio.

— Dave me contou.

— Odeio gente feliz no amor. Dave está namorando o agente dele, né? Que horror, ser feliz na carreira e ainda conseguir um gato daqueles de namorado.

Eu soltei uma risada.

— Seu pai também está de namorada nova, né?

— Sim, o que torna muito inconveniente morar com ele. Depois de eu terminar a faculdade, eu achei que ele fosse sossegar e me deixar em paz, mas agora ele fica me azucrinando para eu cuidar da loja para que ele possa ter tempo livre de sair com a moça por aí.

— Você está bem com isso?

Dei de ombros.

— No fundo, sim. É pacato, e é bom. Não é um mau futuro.

— Entendo... Eu terminei agora um curso de gestão de projetos. Estou aplicando para algumas empresas, as entrevistas sempre acabam em um lugar interessante quando eu falo que fui modelo vivo.

— Consigo imaginar bem a cena.

— É bem atarefado, mas é bom.

E era. Porque sua estrela estava radiante como o Sol, e você estava feliz. Era bom aquilo, saber que você decidiu continuar e que o Destino foi gentil conosco dois. Não precisaríamos de glorias ou de fanfarrões, apenas de pequenas vitórias do dia a dia, e a cada dia vencido, seria uma noite a mais na Terra. E no fundo, era o que importava.

— E quanto aos seus dates no Tinder?

Encostei-me no parapeito da ponte, sabendo que chegaríamos naquele ponto. Em algum momento do ano passado, Dave tinha achado que era hora de acabar com meu celibato patético e me inscreveu no Tinder de novo, sem parar de encher meu saco de novo até que eu o usasse. E até que o usei. Mas...

— Sem sucesso até agora.

— Por quê?

— Sinceridade acima de tudo?

Ele assentiu.

— Por mais que eu tenha tentado seguir em frente, eu nunca, de fato, consegui te superar, Jesse.

Nós dois voltamos a ficar em silêncio, e eu encarei o nada. Olhei para o longe, para a luz que ficava do outro lado, e talvez ela tivesse piscado, e talvez fosse a hora de ir. Mas antes, você começou a falar, e eu decidi esperar meu julgamento.

— Alex... Por mais que eu tenha decidido me afastar da sua vida, para que nossas decisões não influenciassem uma do outro, nesses cinco anos, eu me pegava pensando... ponderando se você estava feliz, se nós dois... se nós dois não erramos por não estarmos juntos. Eu senti sua falta esse tempo todo.

E meu coração saltou no tempo espaço e encontrou você.

— Eu ainda não estou bem, e não sei sequer se um dia estarei, mas...

— Eu também não sei estar bem sem você.

Frente a frente, meu Sol encontrou a sua Estrela e formamos uma galáxia — apenas nossa, com muitos anos ainda pela frente. Meu rosto se aproximou do seu, o tempo perdido estampado nele, e decidi que nunca mais deixaria estes lábios sem beijá-los.

Toquei nossas testas, e você murmurou:

— Devagar, desta vez.

E o tempo parou quando nos encontramos no universo.

Jesse interrompeu o beijo, e eu achei que tinha feito algo errado, dito algo errado, errado de novo, mas:

— Não, espera! Acho que vi uma estrela cadente!

— É? — Eu me virei para os céus, mas eles continuavam tão limpos quanto antes.

— Bem, não foi nada. Volte aqui. — E me puxou de novo pela lapela e me beijou devidamente. Ficamos ali um tempo, nos beijando, quando o frio finalmente chegou em nossos ossos.

— Vamos tomar um café em algum lugar? — convidei, oferecendo minha mão a ele.

— Prefiro um sorvete. — Ele riu, tomando-a, e nossos laços eram intransponíveis. Enquanto íamos embora da ponte, deixando toda a mágoa, mas também pequenos fragmentos de felicidade, agora que estávamos juntos, o inverno de Novembro não parecia tão frio.

FIM

E chegamos ao fim de Hortênsias. Esse livro, que tenho a ideia desde 2008 e que no início era uma fanfic acabou se tornando uma das obras mais pessoais que já escrevi. Muito dos meus sentimentos estão guardados nestas linhas, e fico feliz de tê-los colocado para fora. Agora eles são tão de vocês quanto meus.

A trajetória de Alex e Jesse tem seus altos e baixos, mas assim como a vida, sempre é possível se erguer depois de cair. Não sei o que o futuro reserva a eles, mas eles tem a chance de descobrir. E isso não é maravilhoso?

Agradeço demais se você leu até aqui, acompanhando na news ou no Tapas. Se tem pelo menos uma pessoa lendo, é por isso que escrevo, então tenho um carinho enorme por vocês que me apoiam todos os dias. Muito obrigada!

Estou ansiosa para ouvir seus comentários sobre os últimos capítulos ou a história inteira, seja aqui no beehiiv quando no meu curiouscat, se preferirem anonimidade. Comentários são mais do que bem vindos! Alimente esta autora com biscoitos! Alternadamente, sempre estou online no Kaleidocosmik. Venham fazer parte dele!

Até breve,

Lacie

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